A temporada 2019-2020 está muito próxima. Assim, após quatro jogos de pré-temporada, uma pergunta ainda paira na mente de todo torcedor do Los Angeles Lakers: será que esse é o ano que iremos voltar ao lugar de onde nunca deveríamos ter saído? Essa não é a pretensão deste texto. Com todos os movimentos feitos na Agência Livre, e com a dinâmica da liga mudando drasticamente, qualquer tipo de previsão não passaria de uma mera tentativa desesperada de conforto. Tudo mudou muito. Mas o que podemos dizer com toda certeza é: se tudo correr bem, o Lakers irá disputar forte entre as melhores equipes da liga. O motivo? Anthony Davis.
Essa nossa conversa tem a intenção de fazer um “perfil” do Anthony Davis (ou AD, como iremos chamar daqui em diante), a mais estelar adição do Roxo e Dourado nessa temporada, baseado em três pontos: 1) O que Davis já faz bem; 2) O que Davis pode melhorar; 3) Como deve ser o encaixe de Davis com o restante do elenco. Esse último ponto será apenas uma projeção já que basicamente o elenco todo do Lakers mudou, então não é possível saber exatamente o que irá acontecer. Mesmo assim, não custa tentar.
O que Anthony Davis faz bem?
A resposta dessa pergunta é bem simples: tudo. Por conta do pedido de troca no meio da temporada passada, ficamos com a impressão de que AD não é um jogador saudável e efetivo, contudo, essa narrativa não se suporta.
Em primeiro lugar, atacaremos a narrativa que tenta fazer parecer que Davis é um jogador com muitas lesões. De fato, o astro se machucou muito na carreira (mas nem todas as lesões foram graves), segue a lista a seguir:
Apesar da lista extensa, nos últimos anos, os números são animadores. De 2017 até o pedido de troca em 2019, AD jogou 191 partidas das 210 que poderia ter jogado, ou seja, em 90,95% dos jogos, o astro estava presente. Na última temporada, o pedido de troca fez com que ele fosse poupado na parte final do campeonato e seus números e minutos diminuíssem, por isso, não contamos essas estatísticas porque alterariam o real resultado da pesquisa. Além disso, Davis está totalmente descansado agora, mais do que em qualquer outra temporada que já participou, portanto, essa narrativa de que a estrela perde muitos jogos por lesão pode ser afastada definitivamente. Ademais, como a regra agora na NBA é “poupar jogadores”, espera-se que AD seja poupado e se lesione menos ainda.
Afastada a ideia de que ele se machuca, podemos demonstrar que ele é bom e eficiente em tudo mesmo. Uma prova? Simples, basta compará-lo com Giannis Antetokounmpo, atual MVP e considerado por muitos como o jogador mais dominante da liga nos dias de hoje:
Apenas a título de esclarecimento, as porcentagens ao lado da tabela demonstram o “percentil” do atleta comparado com o restante da liga. Em outras palavras, quando se vê 97,9% em “jogadas um contra um” na tabela de AD, significa que ele é melhor do que 97,9% da liga nesse quesito. Comparativamente, a temporada 2018-2019 para ambos foi praticamente idêntica, com o detalhe que Davis não mostrou todo seu potencial por conta de todos os rumores que o cercaram. O que deixa a pergunta: o que poderia ter sido de AD caso ele tivesse jogado a temporada toda como no início? Projetar um MVP não seria absurdo, ainda mais com o impacto defensivo da estrela.
Mas os números são só uma parte do jogo. Se basquete fosse apenas números, não precisava ser jogado, apenas lido. No “teste visual”, AD também passa em todos. O pivô é a definição perfeita dos “homens grandes modernos” da NBA. Ele marca, arremessa bem, pega rebotes, conduz e controla a bola, protege o aro etc. etc etc etc. AD é, realmente, um monstro que faz tudo, como a NBA exige hoje em dia. Para ele, jogos de 40+ pontos e 10+ rebotes são recorrentes.
Apenas por curiosidade, de todos os “Power-Fowards” da liga, Davis foi um dos que melhor arremessou de longa distância esse ano (33,1%), sendo que ele é o único dos all-stars na posição que está nesta lista. Como dissemos, Davis tem um controle de bola absurdo: o astro começou a carreira como armador, mas um “espichão” quando estava saindo do colégio fez com que ele passasse a ter que jogar como ala-pivô. Mesmo assim, seus talentos como armador nunca desapareceram. Mas se ele é tão bom, no que Davis pode melhorar? Vamos tentar responder essa pergunta.
O que Davis pode melhorar?
É muito sútil, mas caras desse nível precisam sanar alguns vícios e melhorar alguns fundamentos caso queiram subir ainda mais um degrau na escada. Giannis precisa melhorar seu arremesso e a mecânica; Curry precisa aperfeiçoar a defesa; Westbrook precisa desesperadamente de arremesso, e assim por diante. Para esse tipo de estrela, um pequeno ajuste faz total diferença entre “apenas” estrelas e lendas.
Mas, afinal, quais seriam então os pequenos ajustes de Davis? Lembra que citamos a habilidade dele em conduzir a bola? Pois é, AD é realmente incrível nisso, contudo, ele deveria criar ainda mais jogadas para os companheiros. Como um dos melhores pivôs conduzindo a bola, as “apenas” 3.9 assistências de Davis por jogos são um número não muito impressionante. Aliás, na tabela que postamos antes, apesar do evidente melhor controle de bola de AD, foi o Giannis que teve maior “percentil” em “elaboração de jogadas” (apesar de ambos estarem em excelentes níveis).
Fica evidente, então, que AD poderia criar mais jogadas. Como? Bom, aperfeiçoando outro fundamento: a infiltração. Na verdade, aqui, AD não precisa aperfeiçoar, mas sim, variar o estilo um pouco. Por ser muito habilidoso, e por ter jogado como armador, Davis consegue “abaixar” seu ombro para infiltrar – como se estivesse mergulhando – e ainda assim manter o equilíbrio. Algumas imagens retratam bem isso:
Essa capacidade de AD traz vantagens e desvantagens. A vantagem é que, com isso, ele consegue tanto forçar o contato com os jogadores maiores e “cavar” faltas em sua infiltração, quanto ser tão rápido e habilidoso quanto os jogadores menores. A desvantagem, é que com isso, Davis perde a visão da quadra. Após projetar o ombro dessa maneira e com essa inclinação (veja que seu ombro fica muito à frente do joelho) dificilmente ele conseguirá parar para tocar a bola, mesmo com a defesa estando totalmente comprometida em razão de sua infiltração, ou então, raramente ele conseguirá realizar o que chamamos de “drive and kick”, que é quando o jogador infiltra e toca a bola para um companheiro que está do lado de fora do garrafão.
Apenas a título de exemplo, veja como LeBron James utiliza seu corpo para infiltrar algumas vezes:
Veja que os ombros e os joelhos de James estão muito mais alinhados. É claro, como um dos melhores infiltradores que o jogo já viu, é obvio que a estrela de LA também sabe projetar o ombro pra frente sem perder o equilíbrio:
Veja que, nosso ponto, não é que uma forma é certa e a outra errada, mas sim, que cada uma tem uma função. Ao projetar o ombro para frente de maneira tão incisiva, o jogador normalmente visa o contato com falta para finalizar na cesta. Ao estar mais alinhado, ele amplia sua visão e pode envolver mais seus companheiros. AD tem total capacidade de fazer muito mais o segundo “tipo” de infiltração e se preservar mais, além de envolver muito mais os companheiros.
Aliás, com sua altura, Davis poderia até mesmo realizar um “passe parado” – algo que todo armador aprende que não deve fazer desde pequeno – dentro do garrafão. Como disse, esse passe é “contraindicado” aos armadores. É que, em tese, um armador só deve parar de driblar quando já tiver o passe definido. Parar para decidir o passe, o que muitos armadores iniciantes fazem, é um prato cheio para um desperdício de bola. Não é o caso de Davis, assim como não é o caso de LeBron. Por serem muito mais alto que os armadores comuns, ambos conseguem infiltrar, colapsar a defesa adversária e aí parar, observar a movimentação de ambos os times, e realizar o melhor passe, “de cima para baixo”, uma vez que são mais altos que os jogadores da posição.
Observa-se também que LeBron, com sua altura, para não ficar parado com a bola no meio do garrafão, pula com ela na mão, com a intenção de aguardar a defesa adversária reagir à sua infiltração, e aí realiza o passe. De novo, se você não é um armador de 2,0 metros, essa jogada tem grande chance de dar errado. Vejamos alguns exemplos de passe por cima da cabeça de LeBron que podem ser imitados por Davis:
Já vimos Davis fazer alguns passes assim durante os jogos da pré-temporada, principalmente visando encontrar seus companheiros de garrafão, Dwight Howard e JaVale McGee.
Bom, as coisas que Davis pode melhorar possuem um impacto direto no restante do time, que será nosso último ponto.
Como Davis encaixa com o Lakers?
Se a ideia do último time que o Lakers montou era ter diversos “jogadores que podem conduzir a bola” para aliviar James, a ideia do elenco desse ano é justamente o contrário. O Lakers – e o próprio Lebron – assumiram que o lugar de James é na armação. Sejamos sinceros, ele não sabe muito o que fazer sem a bola. Ele é uma estrela tão forte que seu campo gravitacional é gigante o que faz com que o jogo, invariavelmente, gire em torno dele. Por essa razão, a diretoria Angelina decidiu por contratar arremessadores de elite. Saca só a porcentagem de arremessos de 3 “livres” de alguns jogadores do elenco:
Danny Green – 51.3% (99th percentile)
Quinn Cook – 49.6% (90th percentile)
Troy Daniels – 47.9% (84th percentile)
Kentavious Caldwell-Pope – 38.8% (68th percentile)
Jared Dudley – 37.8% (65th percentile)
Não só LeBron se beneficia dessa situação, como Anthony Davis também. É praticamente ilusório assumir que Davis e LeBron jamais precisem de marcação dupla durante uma partida. É claro, não quer dizer que ambos irão sofrer uma defesa especial em todos os momentos, mas sim, com certeza, em algumas situações de jogo, será necessária uma dobra em cima de um deles. Uma dobra em cima de um (ou dois), significa outro(s) jogador(es) livre(s). Dessa forma, é necessário que eles achem esses companheiros, e estes, por sua vez, convertam seus arremessos (que provavelmente devem ser de 3), o que, como vimos, tem grande chance de acontecer.
Vale observar que durante a pré-temporada, os jogadores que foram trazidos para ocupar este papel de “arremessadores” do time, têm falhado miseravelmente. Não há razão para desespero. Esses caras não desaprenderam a arremessar a bola. Simplesmente se faz necessário um ajuste técnico de posicionamento para que eles se encontrem mais vezes nas situações em que seus aproveitamentos são melhores. Não era esperado que tudo fosse perfeito neste tão precoce momento do ano.
Além desse encaixe, com o time, o que mais importa, talvez, é o encaixe com o próprio LBJ, e esse, é praticamente perfeito. Ambas as estrelas são: jogadores dominantes fisicamente, que conseguem arremessar bem, jogar em mais de uma posição e conduzir a bola. Dessa forma, as situações de corta-luz entre eles, por um exemplo, abrem infinitas possibilidades. Aliás, muitos analistas afirmam que Davis é o parceiro mais completo que LeBron já teve.
Aliás, o canal Lakers Film Room, que já citamos aqui outras vezes, fez um vídeo incrível sobre o encaixe entre AD e LeBron (https://www.youtube.com/watch?v=OacOIvkup6g&t=4s) e outro, tão bom quanto, que demonstra o encaixe das duas estrelas com Danny Green (https://www.youtube.com/watch?v=3y3zs7spTKE). De qualquer forma, é difícil prever muito mais nesse ponto. O que pode ser afirmado com certeza é que sim, há um encaixe. O quanto ele será explorado depende das ideias e filosofia de basquete da nova comissão técnica, o que necessariamente passa por Frank Vogel.
Vimos um pouco do potencial dessa dupla na pré-temporada, mas, de novo, muitos ajustes ainda serão feitos, tanto pela nossa equipe, quanto pelos adversários, por isso, o real potencial ainda é desconhecido.
Ufa, que caminho longo! Nesse texto, exploramos a fundo muitos aspectos do jogo de Anthony Davis e sobre seu encaixe com o Lakers. Se você não teve vontade de correr uma maratona depois de ler, cheque seus pulsos porque você pode estar morto (ou não ser torcedor do Roxo e Dourado).
Fontes: foram usados muitos textos para a elaboração desse artigo, mas eu gostaria de destacar que algumas informações foram tiradas do Blog do Lakers a Dois (https://medium.com/@Lakersadois/finalmente-trocamos-por-anthony-davis-mas-o-qu%C3%A3o-bom-esse-cara-realmente-%C3%A9-parte-i-6388b5c38e29); do BBall Index (https://www.bball-index.com/), dos vídeos do Lakers Film Room e dos Podcasts do Locked On Lakers.